terça-feira, 15 de setembro de 2009

O lago do amor

No lago do amor as capivaras se banham tranquilamente.
Enquanto isto, o vento balança as árvores,
e derruba as folhas,
que caem suavemente nas águas.
Os amantes assistem.

Sentado num desses bancos,
ante o cercado que os governantes colocaram
eu penso no amor
tal como deve pensar aquele passarinho que pousa nas costas das capivaras e canta alegremente.

Penso no amor da mesma maneira que o vento deve pensar quando balança as árvores
derruba as folhas
e refresca as pernas das moças sentadas nos bancos junto com seus namorados.

Eu penso, meus leitores,
no amor da mesma maneira que deve pensar este lago
quando recebe em seu corpo o sol, a lua, e o céu estrelado.

E pensando, me maravilho me sinto eterno, e me sinto amado.

À pé

Eia, vinte e sete anos
quase trinta
quase trinta, Deus do Céu,
e nem uma moto ainda!

Eu devia ter no máximo dez anos
meu irmão, uns oito;
a mãe demorava,
o pai certamente não vinha,
então eu falava: vamos!

Do centro da cidade de Dourados,
à nossa casa na Cohab 2,
ganhava quem chegava primeiro...

No mínimo eu era
um desses heróis de filmes japoneses: Jaspion, Giraya, Pegasus e sei lá mais o quê!
Ou então, Airton Senna da Silva contra Nelson Piquet.
Vencia quem chegava primeiro...

Em Campo Grande, a mesma coisa:
o vô enraivecia, a avó rezava: quem toma conta destes meninos?
Descíamos do ônibus bem ali no primeiro ponto da 26 de Agosto,
e até à escola Manoel Ignácio de Souza,
vencia quem chegava primeiro...

Sob os trilhos, pisoteando cascalhos
olhávamos os Exércitos e seus soldados:
– Vai ser um, mano?
– Vou nada!

Nem recruta,
nem soldado,
nem cabo;
vim saber depois: poeta,
escritor,
garçom revoltado,
filósofo,
professor.

Nunca podendo comprar uma moto, um carro
sempre endividado com as despesas de casa
eu andei mais do que um diabo
do que um anjo sem asa.

Ao menos pensei muito na vida nos livros
e me tornei sensível, sensivelmente poeta...

Na praça Ari Coelho

Na praça Ari Coelho
também sou um velho jogador de damas que perde, vence, ri e debocha...

Como é prazeroso esquecer a vida em cima de um tabuleiro durante a partida!
Nada de conflitos existenciais,
nada de filosofias,
nada de questões éticas ou morais:
só a partida, a tática da partida, e nada mais...

Que importa o problema do ser?
Se a essência precede ou não a existência?
Que importa a teoria do conhecimento?
Se o realismo objetivo é o que mais convence?
Que importância tem a questão Deus?
Se Ele existe ou não; e existindo, como ele é?, como devo agir, como devo ser?

Na praça Ari Coelho
junto com outros jogadores
não sou filósofo, não sou poeta, não sou professor nem nada: apenas jogo.
Lá ninguém me escuta falar de Sócrates, Platão, Aristóteles, Kant, Apel ou Nietzsche.
Não falo de Proust, de Baudelaire, de Rimbaud.
Não falo sobre as teorias científicas.
Me calo diante das possíveis formas de governo, não ensino, não levo ninguém à reflexão!

Repito: apenas jogo,
e perco,
e ganho,
e dou risadas, olhando por cima das lentes dos óculos...

Glauber da Rocha

Na praça Ari Coelho . Na praça Ari Coelho também sou um velho jogador de damas que perde, vence, ri e debocha... Como é prazeroso esquecer a...